Uma das grandes estreias da semana é o nacional O Shaolin do Sertão (confira nossa crítica aqui) que presta várias homenagens aos filmes de artes marciais chineses e, para aproveitar o lançamento, nós conversamos com o diretor e roteirista Halder Gomes, que já tinha ganhado destaque no cinema nacional com o inesperado e engraçadíssimo Cine Holliúdy e agora comanda a “pancadaria” no Ceará.

Has Tela Vista: De onde surgiu a inspiração para fazer O Shaolin do Sertão?

Halder: O Shaolin do Sertão é um filme que vem de memórias afetivas de quando eu, Edmilson, Fábio Goulard, Eduardo Cintra e outras pessoas do taekwondo que estão no filme, éramos alucinados pelo gênero de filmes de artes marciais, mas não éramos praticantes das artes marciais. Vivíamos no mundo da fantasia, no universo do lúdico, do fantástico. E O Shaolin do Sertão é o resgate do personagem tal qual um dia nós fomos, associados a um período histórico onde lutadores de vale-tudo profissionais no Ceará iam para o interior desafiar os valentões. Então isso foi o que inspirou retratar esse universo com comédia, nostalgia e aventura esses personagens que são tão reais e verdadeiros.

Has Tela Vista: O humor de  O Shaolin do Sertão está mais para Trapalhões ou KungFuzão?

Halder: Para nenhum dos dois, O Shaolin do Sertão é um filme único. É um humor próprio, particular, que vem do universo da cearensidade, do interior do Ceará, somado a um mundo próprio que é o humor que existe dentro das artes marciais, dos quais eu e Edmilson temos uma vida inteira dedicada a isso. É normal as pessoas buscarem uma referência, uma comparação, quando lidam com o original de forma a criar algum laço para poder encontrar uma explicação para o que está sendo visto ali como algo que nunca foi visto antes. O Shaolin do Sertão é um filme que não existia até então.

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Halder Gomes e o elenco de O Shaolin do Sertão assistindo cenas recém gravadas

Has Tela Vista: Como foi ter Dedé Santana e Falcão nas filmagens?

Halder: Dedé Santana foi uma honra, um sonho, uma realização, um presente de vida quando eu tive a oportunidade de finalmente conhecer Os Trapalhões. E dessa vez não mais apenas conhecer, mas tendo no elenco. Foi uma grande honra, uma pessoa incrível, de uma simplicidade absurda e que acabou virando um grande paizão do set inteiro. E o Falcão é uma figura que já trabalhei no Cine Holliúdy, um cara incrível que se entregou a um personagem e se tornou o Falcão ator, desvinculando do personagem Falcão. Isso foi um grande desafio pra mim como ator e pra mim como diretor também, como fazer o expectador desassociar rapidamente que ali não é mais o Falcão e sim o personagem que está no filme.

Has Tela Vista: O Shaolin do Sertão parece abordar um cultura bem regionalizada, como você espera que seja a recepção do filme fora do nordeste?

Halder: Essa questão do regional é algo que se você parar pra pensar, todo filme em qualquer lugar da terra é regional porque retrata algum lugar. Se a gente olhar, por exemplo, um filme como Manhattan do Woody Allen, que retrata um microcosmos da ilha de Manhattan especificamente, ele é um filme paroquial e é universal. Existe sempre uma tendência a achar que o que vai do Rio e São Paulo pra fora é universal e o que vem de lá pra cá é regional, o que não é. Tudo é regional. Um filme feito na China é regional, um filme feito na arábia é regional, um filme feito no Ceará é regional e um filme feito no Rio e São Paulo é regional. A história e essência desse universo do Shaolin do Sertão é universal. Quando mais microcosmo for retratar o universo de uma cultura, mais universal ele se torna, ele entra no lado minimalista do ser humano, no lado sensível, no lado humano das culturas. E eu acho que isso é onde O Shaolin se torna mais universal ainda.

Has Tela Vista: Quais seus filmes e atores de artes marciais favoritos?

Halder: O Bruce Lee sempre vem como referência, ele foi quem me inspirou a começar na arte marcial, um cara que era a frente da sua época com uma técnica incrível, um cara que revolucionou o mercado de filmes de artes marciais no mundo. E era um grande pensador, então tenho uma grande admiração por ele. E gosto muito dos filmes dele, mas também gosto de filme do Jackie Chan, Jean Claude Van Damme, Jet Li, Donnie Yen, enfim. Eu tenho uma lista enorme de filmes que eu tenho uma grande admiração. Karate Kid acho um filme muito bacana, Coração de Dragão do Bruce Lee, Operação China do Jet Li, Rocky, do Rock Balboa (Sylvester Stallone). Recentemente o filme que eu gostei demais foi o do José Aldo, achei sensacional.

Has Tela Vista: O que você acha dessa febre de filmes de super heróis?

Halder: Sinceramente eu não sou um aficionado de filmes de super-herói. Eu acho esses super-heróis americanos muito desencontrados da nossa realidade. Eu gosto de super-heróis como Aluísio Li, como Francisgleydisson, que tem a ver com a nossa realidade. Esses super-heróis que vestem uma cueca por cima das calças, botam uma capa, se enfeitam todo são um pouco non sense pra mim. O homem aranha especificamente é o que tenho mais interesse entre todos esses por essa questão da vertigem. De ser um cara que tem medo de altura mas também tem uma admiração muito grande por essa questão de quem tem coragem de enfrentar a altura. Talvez seja único que eu tenha alguma identificação. O Hulk eu gosto muito, mas não considero como um herói, é uma vítima de um experimento que deu errado. Mas eu gostava demais da série do Incrível Hulk, era uma série que tinha uma história linda e era emocionante. Esses Hulks de borracha e de plástico de hoje, eu não gosto.

Has Tela Vista: Depois da boa repercussão do Cine Holliúdy, como você lida com a expectativa que se criou em cima do seu novo filme?

Halder: Eu lido de uma forma muito tranquila como um pintor que tem uma marca, um estilo, uma assinatura e vai pintar um outro quadro do universo que pertence ao seu estilo, ao seu traço. Então é um trabalho que eu tenho um profundo conhecimento de causa, é um humor, um gênero que pelas experiências de vida que eu tive, eu estava completamente seguro que dali viria uma boa história e dali viria um filme muito bem feito, muito lapidado, pela evolução como diretor que eu tive ao longo do tempo e a maturidade técnica e artística que a gente adquire com a experiência.

Existe algum plano para a continuação do Cine Holliúdy?

Sim, existe. A parte 2 já está em pré-produção, vamos filmar em janeiro e lançar possivelmente em outubro ou novembro de 2017. É um filme que de certa forma involuntariamente fechou a trilogia junto com O Shaolin do Sertão e Cine Holliúdy 1, da influência da cultura dos filmes de kung fu, da cultura chinesa e da cultura popular do Ceará em um certo segmento da sociedade.